Alfredo estava envolvido com seus pensamentos e
mal se deu conta da presença de Carol diante dele.
-
Desculpe, eu estava distraído – respondeu apressadamente, deixando seus
pensamentos de lado – compreendo que não queira deixar os garotos sozinhos. Fez
bem em ficar fazendo-lhes companhia.
-
A partida de mamãe foi muito brusca. Não me conformo.
-
A morte faz parte da vida. Tudo é um ciclo. Nascemos, vivemos e depois
morremos.A mort não é o fim, mas um início
Pela
primeira vez, ele tercia comentários sobre a morte, se colocando na condição de
uma pessoa que já tivesse passado por tal experiência. Somente depois de ter
falado é que se deu conta disso.
-
Não acho justo. Tenho questionado muito sobre a vida.- começou a falar Carol -
Enquanto temos saúde e nossos entes queridos estão bem, não lembramos que a
morte existe. Quando ela mostra a sua face, caímos na realidade e somos tomados
de muita revolta. Acho a morte uma injustiça, algo sem propósito.
-
Acha isso mesmo?
-
Respondeu Carol - É preferível não nascer. Não tem sentido nascer para depois
morrer. Muitos deixam a vida em plena juventude. Os pais ficam abalados e
sofrem muito com isso.
- Não diga bobagens e tão pouco queira julgar as leis de Deus. Vejo que está muito revoltada diante da perda que sofreu. Até compreendo suas
razões, mas as razões divinas são bem maiores que as suas, minha cara. Você não
pode se colocar acima de Deus para julgar suas leis.O homem ainda não tem capacidade para entender os misterios divinos.
-
Mamãe quando me contou sobre voce ,e falou um dos seus conhecimentos espirituais. Para ser sincera,
acho tudo isso um intrincado jogo de palavras e filosofias. Cada crença diz uma
coisa. Cada igreja tem uma opinião. No fim, se apurarmos tudo o que é dito,
acabamos descobrindo que ninguém sabe de coisa alguma e muitos ainda se dizem
os escolhidos.
-
Isso é a sua opinião, não é mesmo? Tão pouco Deus nao inventou a religião.
Ela
calou. Na verdade, era a sua opinião sim, e isso não tornaria válidas suas
palavras. Precisava de argumentos, mas só a sua revolta é que encontrava para
expor sua dor naquele momento.
Alfredo
percebia a sua insegurança e aproveitou enquanto estava calada para
confortá-la.
-
Minha amiga, não se revolte com as leis divinas. Sua mãe pode ter morrido para
a vida material, mas agora ela renasceu para a vida espiritual, que é a
verdadeira vida. A dimensão da matéria não passa de uma ilusão temporária,
aonde o espírito vem para aprender, evoluir e cumprir determinadas missões que
lhe foram dadas. O homem se apega a esta dimensão como sendo uma verdade e
esquece por completo que a vida reside verdadeiramente na dimensão espiritual.
Você fala e imagina que é este corpo que está pensando e falando. Será mesmo?
Ou é o seu espírito que, através de um corpo físico, se manifesta na matéria?
Poderá a matéria pensar e ter sentimentos? Sem a inteligência divina, você não
estaria gerando em seu ventre um outro ser vivo que amanhã vai gerar outro ser
e assim por diante, perpetuando a espécie humana. Somente um ser é capaz de amar,
é capaz de criar tanta beleza e perfeição, e a esse ser chamamos Deus. O amor
que o homem sente é ainda muito pequeno e até mesmo insignificante se comparado ao de Deus. Sendo Deus
perfeito, não cometeria injustiças, e a verdadeira morte para o homem está em
não poder contemplar a Deus, e não a de perecer nesta dimensão material.
-
Não consigo sentir dessa forma – disse ela, ainda resistindo ao que acabara de
ouvir e continuou – acho a morte uma coisa sem um propósito justo.
-
Você sempre pensou assim ou pensa agora que perdeu a sua mãe?
-
Sempre pensei assim. Senti a mesma revolta quando perdi o meu pai.
-
Gostaria que todos vivessem mais tempo, para sempre, se possível?
-
Para sempre, acho que não – ao dizer isso, Carol pareceu confusa.
-
Então, acha que todos deveriam morrer um dia?
-
Você me deixa confusa.
-
Ou é você que esteve sempre confusa quanto à morte?
Ela
silenciou novamente. Percebia que seus argumentos estavam fundados apenas na
sua revolta e no medo do desconhecido que encobre a morte.
Alfredo
completou:
-
Talvez essa sua revolta se justifique pelo fato do curto tempo em que uma
pessoa vive neste mundo. Talvez, se o homem vivesse mais tempo aqui, ele
aceitasse a morte com mais tranquilidade, não é isso?
-
Acho que sim.
-
O homem, através dos tempos, vem evoluindo gradativamente. Tudo a seu tempo.
Uma evolução de cada vez, entende?
-
Sim.
-
No futuro, talvez ainda na sua época, ou na de seu filho que vai nascer, pode
ser que o homem descubra meios de retardar o envelhecimento. Então poderá viver
até mais de 120 anos, ou ainda mais. Porém, para que esse dia chegue, será preciso haver um
controle rígido da população mundial. Sem esse controle, não haverá alimentos e
trabalho para todos e, certamente, isso resultará em uma grande miséria e revolta. No
início dessa descoberta, poucos terão acesso a esse processo de retardamento do
envelhecimento, mas lá mais adiante, talvez existindo um controle da
natalidade, todos poderão desfrutar dessa maravilha. Imagine que grandes
cientistas possam viver mais tempo e, com isso, transmitir maiores ensinamentos
para a humanidade. Então, o avanço evolutivo do homem será ainda maior, não
acha? Por outro lado, o homem terá que parar de interferir na natureza da forma
que vem fazendo, ou do contrário ele nunca verá esse dia chegar. O homem
precisa do meio ambiente equilibrado para sobreviver neste planeta. No momento
atual, o homem é por demais egoísta em suas conquistas, e não olha com maior
atenção o mundo em que vive. Dessa forma, poderá estar criando um mundo
envenenado e sem a menor possibilidade de vida no planeta. Mas acredito que
espíritos evoluídos venham em socorro da humanidade e, em breve, muita coisa
possa mudar.
-
Isso é mesmo verdade?
-
Claro. Não tardará o dia em que isso vai acontecer. Porém, existem muitas
coisas erradas que o homem terá que reparar. As principais serão o combate ao
tóxico, o ópio, tabaco, álcool, poluição
e a mais importante: o amor pelo seu semelhante. Essas drogas fazem mal ao
corpo físico, e alimentar um ser viciado com algo que prolongue sua vida seria
um erro ainda maior. Mas, para isso, seria também necessária a reformulação das
leis em muitos países, no combate às drogas e à impunidade daqueles que
utilizam o poder em uso próprio. Tem muita coisa errada nos governos do mundo
inteiro que precisa ter um fim, para que o homem transforme a terra num
verdadeiro paraíso, pois, em nome de um progresso, muito deles estão sufocando
o planeta. Além disso, é preciso que todos passem por uma mudança interior,
voltando-se mais para a vida espiritual e aprendendo, a respeitar mais a
vida e amar uns aos outros. A grande conquista que a humanidade conseguirá no prolongamento da vida, sera em muitos casos a utilização do emprego das células troncos do cordão umbilical.
-
E como poderia começar por mudar a mim mesma?
-
Para começar, esqueça sua revolta contra a morte. Dedique-se ao bem e
prepare-se para a verdadeira vida, que é a vida espiritual. Ajude a encontrar
soluções para o mais desamparado e socorra os necessitados que padecem na
miséria. Aprenda a dar amor a quem dele precisa.
-
Por onde devo começar?
-
Aperfeiçoando-se espiritualmente. Depois, pense o que nunca foi pensado.
Procure descobrir o que ainda não foi descoberto, imaginando o que nunca foi imaginado.
-
Eu não sei como fazer isso – falou, demonstrando estar confusa com sua
orientação.
-
Não sabe, mas pode aprender, pois todos são capazes de fazer muito mais do que
imaginam.
Carol
olhou diretamente para o espelho e perguntou:
-
Afinal, quem é você?
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